<< Voltar para o BLOG

Entre o cuidar e se cuidar
Eu não sei para você, mas nem acredito que já estamos quase em dezembro. Mais um ano está chegando ao fim, e quão intenso foram esses últimos dois anos com a pandemia. Ficar restritos em casa, talvez com medo e se sentindo inseguros com tudo o que estava acontecendo. Mudanças bruscas na rotina e no convívio familiar. Conflitos que antes nem existiam passaram a acontecer. Pensando sobre esse período, como tem sido para você e sua família? Talvez o impacto fosse pouco ou quase nada. Ou, então, o quão desafiador foi o início os tenham surpreendidos. Talvez ainda hoje haja questões ainda não resolvidas. Independente de como você analisa a relação familiar neste momento, acredito que o que irei trazer aqui valerá a pena.
Neste instante eu te convido a pensar sobre como tem sido o convívio e a rotina familiar em sua casa. É um ambiente a qual você se sente bem e satisfeito? Ou que parece sugar suas forças? Ou até mesmo parece desconectado e indiferente? Por vezes, temos dificuldade para reconhecer como estamos nos sentindo porque temos medo de que isso revele que falhamos como pais ou cônjuges. No entanto, a falta de reconhecimento do nosso sentir impede que exerçamos os nossos papéis como desejamos.
Então, o primeiro ponto importante é se conectar a si mesmo. Perceber o que está aí presente dentro de si. As suas emoções, os seus pensamentos, os seus medos e os seus desejos. Estar atento ao que te dói e acolher até o que é desagradável para ti. Não adianta tentar resolver as coisas externas se o que é interno é ignorado. Pois quem cuidará de você se você não validar o que sente?
Talvez você me diga que é difícil ou que não tem tempo para isso. E sim, não é fácil e simples no começo, porque aprendemos que ser forte é encarar tudo de peito aberto sem reclamar. Aprendemos que devemos ignorar como nos sentimos diante das responsabilidades, que só precisamos seguir adiante. No entanto, pouco se é comentado sobre o resultado desse aprendizado. Quase ninguém diz o alto custo disso. Mas ainda assim o preço vem e você quem arcará com ele. Por isso, falo o quanto é importante que você busque se ouvir, acolha as suas dores e seja compassivo consigo mesmo.
O segundo ponto importante que quero abordar aqui é sobre compartilhar as suas fragilidades com a sua família. Por muitas vezes você provavelmente fez o papel da pessoa que acolhe e escuta, mas será que o inverso tem acontecido? Falar sobre os seus medos e angústias para a sua família não é “jogar um peso” sobre eles. Na verdade, isso os aproxima. Gera mais confiança e aprofunda a conexão entre vocês. Possibilita que outra pessoa também exerça o papel de cuidador. Além disso, os seus filhos começam a aprender contigo como é importante reconhecer as próprias emoções e que é natural conversar sobre isso. Isso os ajuda a crescer em um ambiente que eles se sintam seguros.
Então, como conversar sobre as nossas fragilidades? Você pode começar dizendo como gostaria de ser escutado para que diminua a possibilidade de se sentir frustrado após a conversa. “É muito importante para mim que você apenas ouvisse. O que vou falar é difícil para mim e ainda tenho dificuldade para expor, mas quero compartilhar com alguém.” Ou “Eu estou me sentindo angustiado com tal situação, você já vivenciou algo assim?” são alguns exemplos de como você pode começar. Você também pode preparar o ambiente para o diálogo. Ou seja, ao invés de esperar pelo melhor momento (que não existe), você irá escolher o dia, a hora e o local para aquela conversa. Foque em momentos do dia que sejam menos atarefados ou estressantes e que haja o mínimo de interrupções possíveis.
Com isso, vamos para o terceiro e último ponto importante. Muitas vezes, culpabilizamos a nós mesmos, aos outros ou à situação pela forma como nos sentimos, o que acaba prejudicando a relação familiar. Isso porque a culpa geralmente é carregada de julgamentos e críticas. E como lidar com isso? Compreender a armadilha da culpa já é um começo. Quando estamos mais preocupados em encontrar os culpados para condenar e punir, diminuímos a nossa disponibilidade para compreender qual é o problema e ainda mais a buscar formas para lidar com ele. Caímos em uma armadilha que nos impede de nos conectar com o que é importante e possibilitamos que o outro fique na defensiva, criando uma barreira entre vocês. Perceber quando está agindo assim te ajuda a quebrar esse ciclo.
Desta forma, é possível se conectar cada vez mais com a sua família sem perder de vista você mesmo. Há momentos que pode parecer mais difíceis do que outros, nem sempre ser cuidador é uma tarefa fácil, mas você não está sozinho nesta jornada. Busque em quem se apoiar.
Escrito por Ana Patrícia Freire do Amaral Monteiro, psicóloga – CRP 11/13449
REFERÊNCIAS
ROSENBERG, Marshall B. Comunicação Não-Violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. São Paulo: Ágora, 2006.
STONE, Douglas; PATTON, Bruce; HEEN, Sheila. Conversas difíceis: como argumentar sobre questões importantes. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

